quinta-feira, 4 de agosto de 2011

A Terapia do Coração

Fonte: revistamarieclaire.globo.com


O psicólogo Ailton Amélio* utiliza há sete anos um método para ajudar homens e mulheres a romper os vínculos amorosos. a técnica não é rápida nem indolor, mas ajuda a aliviar o sofrimento da separação


Marie Claire – Quando se perde um amor, dá para se desapaixonar? Existe algum método? 
Ailton Amélio – Sim, existem maneiras de apressar o término do amor. Não é fácil, não é mágica nem força de vontade. É demorado, exige várias sessões de terapia. Mas há um método eficiente, que desenvolvi a partir de muitos estudos que existem sobre o tema. 




MC – Conte sobre esse trabalho. O senhor recorreu a um escritor para entender de amor? 
AA – O escritor francês Jean-Marie Stendhal é conhecido pelos romances, mas ele também escreveu uma teoria sobre o amor, que é bem conceituada. Segundo ele, são necessárias três coisas para o amor nascer: admiração, esperança e uma dose de insegurança.




MC – Como aplicar isso no consultório? 
AA – Uso a teoria de Stendhal ao contrário. A pessoa admira o outro e tem esperança que um dia haverá reciprocidade. Geralmente a admiração é baseada em idealização. Então, começo a questionar o paciente por aí: 'O outro é assim mesmo? Como é que você sabe? Faça uma lista das características positivas e negativas dele. Por que considera isso positivo? Isso é positivo agora, mas viver com uma pessoa assim seria desejável?'. O objetivo não é distorcer o que a pessoa vê, mas procurar fazer com que ela se conscientize do que é real e do que é imaginação, e que entre em contato com o lado negativo. Quando a pessoa está apaixonada, subestima a importância do que é negativo. 




MC – Como avaliar a esperança de alguém apaixonado? 
AA – Eu ajudo o paciente a verificar se a reciprocidade realmente existe. Mando ir checar para ver se é correspondida, se a coisa rola, se vai para frente. 




MC – Mas os apaixonados montam as histórias do jeito que querem. O outro pode até avisar, mas o apaixonado não ouve... 
AA – É preciso verificar com eficácia. Existem sinais que a pessoa emite. Por exemplo, pegar na mão do outro e ver se ele corresponde, se entrelaça os dedos, se retribui o beijo... Existe uma escala de táticas graduais. Com delicadeza, a pessoa terá a sua resposta. E quando se recebe um 'não' definitivo, acaba a esperança e o amor morre. Não imediatamente, mas acaba. É dolorido, mas um 'não' abrevia o sofrimento da pessoa apaixonada.




MC – O senhor usa este método em que situações? 
AA – Em casos de separação, de 'foras', de traição. Quando a pessoa não consegue se desvencilhar da história. Mas ninguém se desapaixona de repente, é um processo, leva meses. Mas é possível ajudar e aliviar a dor. 




MC – Existe 'morte súbita' no amor? Um rompimento inesperado, que desestrutura o outro? 
AA – Não acredito. O parceiro sempre emite sinais de que algo não vai bem. 




MC – Existe um caminho a percorrer para quem quer se desapaixonar? 
AA – Tem gente que chega no consultório apaixonadíssima, sofrendo, obcecada, muitas vezes ultradeprimida. Há várias maneiras de mudar o quadro. Tem o clássico 'amor com amor se cura'. Às vezes, para se desapaixonar, a pessoa tem que melhorar a auto-estima, principalmente quando ela está se sentindo um lixo, acha que não vai encontrar outra pessoa, que o parceiro era maravilhoso e representava a última oportunidade de felicidade. 




MC – Quando se cria uma fantasia muito grande do outro, é difícil mudar sua imagem. 
AA – Não é fácil, até porque muitos sinais de amor se confundem com amizade e gentileza. Tive uma paciente que via um sinalzinho qualquer e ficava alegre. No outro dia, ele dava um sinal diferente, ela ficava triste. Ela não sabia se ou outro gostava dela ou não. Ela era tímida e foi necessário trabalhar isso. Aí ela verificou e ficou sabendo que o sujeito ia casar com outra. Ela estava há dois anos desse jeito... Existem situações ambíguas que alimentam indefinidamente o amor. 




MC – Uma hora o parceiro quer, depois ele some ou fica evasivo: a ambigüidade dificulta o desligamento? 
AA – Completamente. Tratei de uma pessoa que tinha um amante e estava tentando se separar dele. Ela melhorava, depois regredia porque o outro, quando via que ia perdê-la, dava esperanças de novo. Tive que chamá-lo ao consultório. Ele felizmente veio, e não tinha consciência do mal que estava fazendo. A moça estava perdendo o emprego, estava com a saúde abalada. Quando ele soube, parou de dar esperança. Ela sofreu pra burro. O sofrimento é agudo, mas é abreviado. E aí a vida continua... Se ele não viesse, a terapia teria que ajudá-la a perceber que era um jogo indefinido, que ele nunca se comprometia. 




MC – Muitas pessoas sofrem com infidelidade, mas se apaixonam por infiéis. Por quê? 
AA – O problema é que você acha que, com você, o outro vai ser fiel... A pessoa apaixonada quer acreditar que foi só uma vez; o parceiro pode dizer que aquilo não significou nada e ela quer acreditar. Mas depois de duas, três, quatro vezes, a pessoa perde a esperança e este elemento é 'desapaixonador'. 




MC – As pessoas mais sedutoras são as mais ambíguas? 
AA – Às vezes a pessoa não esclarece a situação, dizendo que não quer magoar o outro -mas o que quer é deixar a porta aberta por interesse. Ou então está inseguro mesmo, aí tem direito de esperar mais para decidir. Mas tem o estilo 'Don Juan', gente que tem dificuldade em fazer vínculos. Não fecha as relações, deixa sempre a possibilidade da volta. Neste caso, quem tem que fechar a relação é quem se apaixonou pelo 'Don Juan'. 




MC – Qual a melhor atitude a tomar quando deixamos de amar alguém? 
AA – Eu sugiro que se mate o amor do outro. É cruel deixar no ar, ser dúbio, porque o outro fica apaixonado um tempão. Isso é uma pseudo dó do outro, é o maior desserviço que se pode fazer. Vai prolongar o tempo em que o outro vai ficar apaixonado, esperando. Parece cruel romper, mas não é. É como dar uma injeção numa criança, que tem medo da dor. Mas se não der, vai gangrenar. Tem que falar claro. Com jeito, com respeito, mas de maneira definitiva. Não deixe esperança. Ele sofre, é dolorido, mas é rápido. Senão a pessoa fica com o coração ocupado, não segue a vida, não entra em outra relação. 




MC – Mas nem tudo é tão claro. Existe conflito e contradição na relação de amor... 
AA – A ambiguidade é intrínseca ao relacionamento amoroso, mas no começo. Todo início é ambíguo por natureza, é para ser assim mesmo, as pessoas estão se conhecendo e ainda não têm certeza de nada. Todos os animais que formam pares duradouros vivem um tempo longo de cortejamento, até a coisa colar. Porque você pode desistir, querer outro, é um processo de escolha ainda. A insegurança é natural. Mas quando não quer mais, não seja ambíguo. Causa mal, causa dano.



Entrevista a Daniela Chiaretti 
* Ailton Amélio é professor no Instituto de Psicologia da 
Universidade de São Paulo e autor do livro 'O Mapa do Amor' (Ed. Gente).

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